Não é exatamente uma novidade: a sociedade contemporânea atribui grande valor à aparência corporal e à beleza. Diante disso, o corpo tem se tornado alvo crescente de investimentos de tempo, energia e dinheiro. Prova disso é o aumento drástico dos métodos de cuidados com o corpo (invasivos ou não) observados nas últimas décadas. Dietas, uso de suplementos alimentares, cosméticos, musculação, ginásticas, massagens, cirurgias e procedimentos estéticos são alguns exemplos de estratégias amplamente utilizadas.
Logicamente, não há nenhum problema em cuidar da própria imagem. Pelo contrário, isso pode ajudar a fortalecer a autoestima e a autoconfiança. Entretanto, a busca desmedida pelo “corpo ideal” pode atravessar a fronteira da saúde e trazer diversos riscos, sendo o uso de esteroides anabolizantes um deles.
Esteroides Anabolizantes, o que são?
Os esteroides anabolizantes são substâncias sintéticas ou semissintéticas quimicamente relacionadas ao hormônio sexual masculino testosterona. Clinicamente, essas medicações são prescritas com parcimônia, indicadas para o tratamento de algumas condições: sarcopenias, hipogonadismo, câncer de mama, osteoporose, estados catabólicos entre outros. O uso não médico é realizado com a finalidade de ganhar massa muscular, perder peso, melhorar o desempenho atlético e aprimorar a aparência corporal. Nesses casos, a dosagem é entre 10 e 100 vezes maior que a usada no tratamento das condições anteriormente citadas. Geralmente, os usuários de anabolizantes são homens jovens, entre os 20 e 30 anos. O uso entre mulheres é menos comum, pois o uso dessas substâncias acarreta efeitos masculinizantes.
Efeitos dos Esteroides Anabolizantes
A ação dos esteroides anabolizantes ocorre em diversos tecidos-alvo, incluindo o sistema reprodutor, o sistema nervoso central, a glândula pituitária anterior, o rim, o fígado, os músculos e o coração. Os principais efeitos androgênicos são: crescimento do pênis, espessamento das cordas vocais, aumento da libido, aumento da secreção das glândulas sebáceas e crescimento de pelo no corpo e na face. Os principais efeitos anabólicos são: aumento da massa muscular esquelética, aumento da concentração de hemoglobina, aumento do hematócrito, aumento da retenção de nitrogênio, redução dos estoques de gordura corporal e aumento da deposição de cálcio nos ossos.
Efeitos Colaterais dos Esteroides Anabolizantes
O uso de anabolizantes pode acarretar uma série de desfechos clínicos e psiquiátricos. Vários estudos já listaram os efeitos nocivos sobre os diferentes órgãos e sistemas como os musculoesqueléticos, hepático, dermatológico, reprodutor e cardiovascular. A longo prazo, o uso indevido de esteroides anabolizantes pode levar a problemas de saúde sérios, até permanentes, como problemas renais ou insuficiência, danos no fígado (incluindo doença hepática e cirrose) e tumores, cardiomegalia (coração aumentado), pressão alta e alterações no colesterol no sangue, todos os quais aumentam o risco de acidente vascular cerebral e ataque cardíaco, mesmo em jovens, aumento no risco de lesões aos tendões, dor nas articulações, aumento do risco de coágulos sanguíneos, hipertrofia de próstata e ginecomastia, acnes, estrias e calvície, atrofia testicular com azoospermia e infertilidade. Vários outros efeitos são específicos de gênero e idade, conforme destacado a seguir:
• Nos homens: encolhimento dos testículos, diminuição da contagem de esperma, calvície, aumento das mamas, aumento do risco de câncer de próstata.
• Nas mulheres: crescimento de pelos faciais ou excesso de pelos no corpo, redução das mamas, calvície, alterações ou interrupção no ciclo menstrual, aumento do tamanho do clitóris, voz mais grave.
• Em adolescentes: crescimento atrofiado (quando altos níveis hormonais de esteroides sinalizam ao corpo para interromper o crescimento ósseo muito cedo), altura atrofiada (se os adolescentes usarem esteroides antes do surto de crescimento).
Consequências do Uso de Esteroides Anabolizantes na Saúde Mental
O uso de esteroides anabolizantes está associado a distúrbios de humor e ansiedade, bem como comportamento imprudente. Alguns indivíduos podem experimentar sintomas de hipomania ou mania durante a exposição a anabolizantes e sintomas depressivos durante a síndrome de abstinência dessa substância. As principais consequências são ciúme paranoico (extremo, irracional), resposta agressiva repentina e exagerada, comportamento extremamente violento, delírios (falsas crenças ou ideias), julgamento prejudicado, mania/hipomania (podem ocorrer sintomas psicóticos), ansiedade, depressão e alterações no sono.
Os Esteroides Anabolizantes São Viciantes?
O uso indevido contínuo de esteroides pode atuar em algumas das mesmas vias cerebrais e substâncias químicas que são afetadas por outras drogas, incluindo dopamina, serotonina e sistemas opioide. Mesmo que os esteroides anabolizantes não causem o mesmo efeito de outras drogas, eles podem levar a um transtorno por uso de substâncias. Um transtorno por uso de substâncias ocorre quando uma pessoa continua a fazer uso indevido de esteroides, mesmo que haja sérias consequências por isso. A forma mais grave de um transtorno por uso de substâncias é a dependência. As pessoas podem continuar a fazer uso indevido de esteroides apesar dos problemas físicos, dos altos custos para comprar as drogas e dos efeitos negativos em seus relacionamentos. Esses comportamentos refletem o potencial viciante.
Durante a interrupção do uso podem ocorrer sintomas de abstinência
Ao interromper o uso de anabolizantes, as pessoas podem apresentar sintomas como fadiga, inquietação, perda de apetite, alterações no sono, diminuição do desejo sexual e desejo de usar esteroides. Caso esses sintomas ocorram, é crucial buscar apoio especializado. Psicólogos e psiquiatras que trabalham com ênfase em Dependência Química são os profissionais mais indicados para realizar o acompanhamento. Consultar esses especialistas permite uma avaliação abrangente dos aspectos físicos e psicológicos da situação, incluindo possíveis comorbidades. Eles oferecerão suporte emocional, conduzirão avaliações adequadas e proporão estratégias terapêuticas, como a terapia cognitivo-comportamental. Além disso, esses profissionais podem orientar sobre tratamentos de substituição, quando necessário, proporcionando uma abordagem segura e eficaz para enfrentar os desafios da abstinência de anabolizantes. Ressalta-se a importância de evitar a automedicação ou o uso de substâncias alternativas sem supervisão médica. Buscar ajuda profissional e seguir um plano de tratamento personalizado são passos cruciais para enfrentar a abstinência de anabolizantes de maneira eficaz e segura.
Referências
Diehl, A., Silva, S. Q. (2011). Anabolizantes. Em Dependência Química - Prevenção, Tratamento e Políticas Públicas. Alessandra Diehl... [et al.]. Porto Alegre: Artmed.
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